Caio Castelo: do quarto "Passo" da carreira autoral aos saraus dos Comparsas, outros toques sobre a cena do Ceará para o Brasil
O cantor, compositor e produtor musical Caio Castelo está lançando seu quarto disco, "Passo", e se apresentará no dia 28 de outubro, um sábado, na Casa Absurda, em Fortaleza, no que será o segundo espetáculo de lançamento do álbum.
O primeiríssimo show aconteceu no finalzinho de setembro, dia 30, no Centro Cultural Banco do Nordeste, e foi marcado por muita coesão entre Caio e a banda formada por Jully Nobre na bateria nos samples, Dândara Marquês no contrabaixo e Ivan Timbó em vários teclados. Nem parecia o primeiro show de um projeto, tal o entrosamento entre os músicos e a naturalidade e intensidade com que apresentaram as canções do novo disco.
Caio Castelo, que no dia 18 deste mês de outubro participa em Recife do "pitching" do festival Coquetel Molotov (momento de apresentação de trabalho de artistas, para curadores, jornalistas, programadores de casas e festivais, possíveis contratantes de shows ou divulgadores de músicas), também está celebrando o começo dessa história discográfica.
Ele comemora os 10 anos desde o lançamento de "Silêncio em Movimento", seu álbum de estreia, que também contou com algumas músicas contempladas neste show de lançamento do "Passo". Entre elas, "A banda abandona a cidade", com um novo e ótimo arranjo.
Outra canção de disco anterior a ganhar um novo arranjo no show é "Partir também é chegar", com destaque para a bateria. "Ponto Cego" foi outro momento de destaque na noite, com direito à técnica de sonorização do CCBNB, Clarisse Melo, descobrindo que a música, que ela adora na gravação da cantora e compositora Lorena Nunes, é de autoria de Caio.
E por falar em Caio Castelo e Lorena Nunes, vale lembrar que ambos integraram o coletivo artístico Comparsas da Vivenda, assim como Allan Diniz, responsável pelas fotos de divulgação do disco "Passo" e parceiro de Caio em clipes de muitas canções. Além de parceiro de composição também.
Na plateia do CCBNB, no show de lançamento de "Passo", também estavam os ex-comparsas Richell Martins, cantor, compositor, jornalista, e Amanda Nogueira, percussionista e jornalista, assim como colegas de geração, como a jornalista Rachel Dantas, madrinha de João, filho de Caio e da também jornalista Camilla Lima, companheira de Caio.
Os Comparsas chamaram atenção em Fortaleza em algum momento no final da década de 2000, mantendo um sarau semanal na então iniciante Toca do Plácido - até hoje, ponto movimentado da noite da capital cearense, com direito a shows talvez mais focados em releituras do que em canções autorais. O contrário do que acontecia nos saraus informais daquela época, em que o violão e poucos instrumentos de percussão rodavam de mão em mão, para que todos pudessem cantar, dando preferência ao repertório autoral.
Por ali também passaram "comparsas" como Carlos Hardy, multi-instrumentista e professor de música, e "comparsas dos comparsas", como o poeta, compositor, dramaturgo, produtor cultural e editor Alan Mendonça, parceiro em algumas canções, e vários artistas de diferentes gerações da cena cearense - pra lembrar um deles, o "Véi" Eugênio Leandro, mais bissexto que a maioria, mas que quando em vez brindava o público com suas lindas composições, tocadas e cantadas de sua forma personalíssima.
Nestes idos finais de 2023, Fortaleza segue precisando de espaços como o "Sarau da Toca", em que compositores/as possam passar em desfile suas canções, em que se semeie o diálogo, a parceria, o vislumbrar de ações conjuntas em prol de mais espaço para nossos artistas, nossa cena. Em que se possa conhecer e reconhecer mais essas obras, esses repertórios, o novo que sempre vem, como cantou Belchior, na terra de tantos shows de releituras dedicados a ele. Ou momentos em que simplesmente se possa tirar uma licença da correria dos dias e noites para relaxar, descansar, escutar, se permitir respirar, conhecer, encontrar, abraçar e ser abraçado musical e pessoalmente.
O projeto Temporada Autoral, a propósito, é uma das tentativas de abrir espaço para essa produção, reunindo a cada edição quatro compositores/as. A primeira edição aconteceu no dia 8 de setembro, no palco nobre do Theatro José de Alencar, reunindo este escriba, a jovem Rebeca Câmara e os mestres Edmar Gonçalves e Abidoral Jamacaru.
Incrível como ainda sofremos e lutamos tanto para ver artistas do Cariri se apresentando em Fortaleza. Parece mais difícil que circulação internacional! Tão perto e tão longe! Por isso o Sindicato dos Músicos do Ceará e o Movimento Música do Ceará lutam e reivindicam à Secretaria da Cultura do Estado que todo equipamento cultural estadual tenha pelo menos uma atração do Interior, por mês. Assim como uma atração 60+, para que também seja possível aproximar gerações, ter nossos mestres e mestras se apresentando com frequência, tendo uma agenda pra valer, inseridos nas programações, de fato, em contraponto ao muito pouco que costumam ser lembrados por curadores/as e outros gestores/as com poder de decisão.
Em vez de equipamentos estaduais de fato, esses espaços se tornam muitas vezes apenas municipais, tal o esquecimento ou a falta de hábito, de cultura interna mesmo, para que haja artistas do Interior na programação. O mesmo vale para os artistas de mais de 60, 70, 80 anos, em um mundo tantas vezes suscetível aos apelos do "novo", da "novidade", do "jovem". Absolutamente nada contra. Mas que é possível ter mais espaço para quem já tem mais história pra contar, mais bagagem acumulada, mais estrada percorrida, sem dúvida é! Haja luta, pra fazer acontecer!
De volta ao começo
Mas... bora voltar ao Caio Castelo, que deu ensejo a esse texto, necessário para falar de um artista de tantos - e tão intensos - talentos. O novo disco, "Passo", está sendo lançado pelo selo paulista YB Music, e é definido pelo artista como “uma celebração à impermanência em algum lugar entre a MPB, o pop e o folk”.
Além do show na Casa Absurda no sábado, 28/10, a turnê de lançamento do disco passará ainda por Recife, Natal e Sobral ainda em 2023. Cumpre destacar também que, assim como fez como um pessoal pré-lançamento do trabalho anterior, os EPs "Pontes de Vidro", Caio promoveu uma audição para amigos e colegas, em seu próprio estúdio, o Orelha, localizado em sua residência. Na ocasião, em duas sessões, os mais chegados puderam fechar os olhos e abrir os sentidos para serem os primeiros a conferir as canções do novo disco, recém-finalizadas. Com direito a comentários inspiradores, após cada "sessão". Coisa rara também hoje em dia: estar e se perceber ali, no momento, sem outro foco na atenção que não ouvir música. Experiência que precisamos recuperar.
Nestes encontros, Caio ressaltou inclusive que o novo disco traz seu primeiro samba, bem recebido pelos/as ouvintes. "Tempo bom" é a faixa, que vem se destacando também nas plataformas, como a mais tocada do álbum até aqui.
Algumas outras canções do disco, como a faixa-título, já haviam sido apresentadas circunstancialmente, em festivais ou shows. Mas sem a consciência do álbum como um todo, que surgiu para o artista após os tempos mais difíceis da pandemia, anos de gravações solitárias em casa, mesmo que contribuindo online com outros artistas. Como também fez mais recentemente, superados os piores tempos, ao gravar álbuns como o do compositor Marcus Dias (premiado como melhor disco cearense de 2020), produzir faixas com nomes como Zeca Baleiro, Tiago Araripe e Clau Aniz e dirigir shows de vários artistas, como Silvero Pereira e a Mulher Barbada.
"'Passo' é como se fosse o meu 'segundo primeiro álbum'. Ele vem depois desse período mais longo que passei sem lançar um projeto solo e em que eu também estava participando de várias outras coisas", explicou Caio ao jornal O Povo, em entrevista a João Gabriel Trez.
"Apesar de focado nas parcerias, Caio seguiu criando canções próprias até perceber ligações entre elas. 'Olhei para as músicas e falei: 'Cara, tem um álbum'. Percebi que ele existia e fui gravar as coisas que faltavam, chamar músicos para lapidar tudo. Juntei o conceito, percebi que estava falando muito sobre tempo. Não foi tanto um processo de criação de um álbum, foi mais de descoberta dele'", definiu, na entrevista.
"O nome do trabalho foi escolhido a partir da multiplicidade semântica possível da palavra. 'Um passo pode ser curto, pode ser largo, pode ser verbo', afirma o artista na faixa-título. A ideia da transitoriedade é guia das composições, sendo abordada de diferentes formas".
"É um lance que tento intencionalmente fazer na minha escrita: partir do cotidiano, de pequenos detalhes, do particular, de uma forma que atinja uma universalidade, para que outras pessoas possam conectá-lo com seus universos particulares", explica, na matéria.
Caio reconhece em "Passo", ainda, o que chama de "ecos" dos trabalhos paralelos à carreira. "Cada experiência vai te construindo e estruturando de alguma forma. Vejo um pedacinho delas tanto na parte de produção musical como na poética e na forma de ver as coisas, de me colocar", afirma, na entrevista a João Gabriel
Privilégio para nossa cena
"Na faixa que dá nome ao álbum, canto que ‘um passo pode ser curto, pode ser largo, pode ser verbo’. Cada um de nós tem seu caminho e seu jeito de andar. Damos nossos passos, passamos, e assim cheguei a essas nove maneiras de dizer que tudo se transforma, nada é perfeito e tudo é passageiro”, conta o artista sobre essa nova fase.
Que privilégio para a cena musical do Ceará e do Brasil contar com um artista tão múltiplo - e principalmente com um compositor tão inspirado e consciente quanto Caio, com sua habilidade para escrever, arranjar, tocar, cantar, gravar, mixar e masterizar músicas que logo conquistam o ouvinte. Que as canções de "Passo" cheguem ao maior público é o próximo desafio.
O álbum “Passo”está disponível em todas as plataformas de streaming. Para ouvir: https://lnk.fuga.com/
Mais sobre a trajetória de Caio Castelo:
Desde 2013, Caio vem se apresentando em importantes festivais pelo Brasil, com uma turnê nacional em 2017 e uma incursão por Cabo Verde em 2014. Como produtor, diretor musical e instrumentista, acompanha artistas como Silvero Pereira, Mulher Barbada, Tiago Araripe, Marta Aurélia, entre outros; além de colaborações com nomes como Guilherme Kastrup, Alê Siqueira, Marcelo Jeneci, Zeca Baleiro, Lorena Nunes e Tom Drummond. É também autor das capas dos discos "Futuro e Memória" e "Futuro e Memória 2", de Rogério Franco e Dalwton Moura; "Sonho ou Canção", de Luciano Franco e Dalwton, e dos EPs "Velho Menino", de Rodger Rogério e Dalwton, e "MilitoFrancoMoura", de Luciano, Dalwton e do pianista paulista Osmar Milito, 82 anos. Entre inúmeras capas e identidades visuais para EPs e álbuns.
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