Dalya Moura: a cearense que viu Paul McCartney no Clube do Choro, em show histórico e inédito, para 200 pessoas




A cearense Dalya Moura, advogada, servidora pública, residente em João Pessoa, foi uma das pouquíssimas pessoas a ter o privilégio de ver Sir Paul McCartney no único show intimista que fez no Brasil, país em que se apresenta desde 1990, mas para multidões em estádios como o Maracanã e, em Fortaleza, o Castelão, em 2013. 

Desta vez, Paul começa nesta quinta-feira, 30/11, sua turnê "Got Back", na perna brasileira, iniciando pelo Estádio Mané Garrincha, em Brasília, seguindo para dois shows na novíssima Arena MRV, em Belo Horizonte, um show no Estádio Couto Pereira, em Curitiba; três concertos no Allianz Parque, em São Paulo, e um último show no Maracanã, no dia 16 de dezembro, encerrando a etapa brasileira da turnê que passou por Austrália e México, antes de aportar na América do Sul - para shows somente no Brasil, deixando de fora, para surpresa de muitos, Argentina, Chile e Uruguai.

Dalya chegou a Brasília às 7h desta terça-feira, já sabendo por intermédio de nós que Paul McCartney faria um show "secreto" - ou "surpresa" - no Clube do Choro, um dos mais aclamados espaços culturais de Brasília, casa da música na capital federal e, ao mesmo tempo, sede da Escola de Música Rafael Rabello. A informação ganhou o Instagram nesta segunda, porém sem detalhes de como seriam distribuídos os poucos ingressos, e os grupos de whatsapp onde muitas especulações ocorriam. \

Afinal, os fãs mais ferrenhos do ex-beatle sabem que ele já aprontou "surpresas" assim em cidades como seu porto-natal Liverpool e como Nova York, com anúncio no rádio faltando uma hora para o show e ingressos distribuídos a quem conseguisse chegar nesse intervalo de tempo. 

Um pequeno pub inglês e a Estação de Trem Grand Central Station foram alguns dos espaços-surpresa escolhidos por McCartney, hoje aos 81 anos, e por sua equipe, para shows-surpresa, ou promocionais, como os que marcaram a volta ao Ed Sullivan Theatre, em Nova York, o lançamento do álbum "Egypt Station", também em NY, e um encontro com os fãs em um pub tipicamente britânico em Liverpool. 

Em comum às ocasiões, o fator-surpresa, a criatividade, a disposição e a intensidade do músico em fazer um show para poucas pessoas, como na fase "ballroom" dos Quarrymen ou na fase "universidades britânicas" dos Wings. Tocar para 200 pessoas, como nesta terça-feira histórica, 28/11/23, no Clube do Choro, em uma atitude que demonstrou reconhecimento honroso ao legado desse espaço tão importante para a música brasileira, parece mexer com a eterna juventude de Sir Paul - um "verminoso", como diria o cearense, por tocar, estar no palco, cantar, empunhar seu baixo Hofner, suas guitarras Les Paul e Casino, por sentar ao piano de "Let it be" e ao teclado com a frente colorida pelo grupo britânico The Fool em "Lady Madonna", duas das faixas do show deste noite, de nada menos que 1h40min de duração. Mais do que muitos artistas e grupos fazem, no palco principal, seja em teatros, seja em estádios.

Dalya Moura, a cearense de 41 anos, comprou ingressos para os shows de Paul McCartney em Brasília e Belo Horizonte, dando sequência a uma série de apresentações do ex-beatle iniciada em 2010 e em que ela estave presente em todas as turnês, ao lado dos irmãos Dalwton e Dayana. Às 9h da manhã desta terça, fãs sorteados entre os que compraram ingresso para Brasília receberam em seus emails um link para a compra de ingressos para o show extra, no Clube do Choro. As entradas não duraram cinco minutos, deixando de fora muitos que tiveram o privilégio de ser sorteados. Cada um podia adquirir no máximo dois ingressos, intransferíveis. Regras são regras, e alguma forma de organizar a presença dos fãs era necessária.

Mesmo sem ter sido sorteada, Dalya partiu direto do aeroporto de Brasília para o Clube do Choro, e ali ficou desde as primeiras horas da manhã até o final da tarde, "mendigando" algum ingresso, pedindo a todos e a cada um/a que se possível cedesse um bilhete, falando sobre a situação de querer assistir ao show mas não ter sido contemplada no sorteio. Ao fim de muitas horas, decidiu ir rapidamente à hospedagem deixar as bagagens e também almoçar, depois de ter "virado a noite" em voo e de não ter se alimentado. 

Enfrentou muita frustração quando, após vigília o dia todo, não conseguiu ninguém que topasse a levar ao show como acompanhante, na fase de entrega de pulseiras, que durou de meio-dia e meia às 15h30, no Planetário de Brasília, ao lado do espaço do show. Mas não desanimou mesmo quando a turma começou a trocar as pulseiras por ingressos, e quando o relógio batia cada vez mais rápido anunciando a proximidade do horário do show, marcado para as 18h, no Clube do Choro. E olhe que muitos fãs criaram um grupo de whatsapp com este nome - "clube do choro" - em referência irônica ao lamento e às lágrimas dos que não foram contemplados no frio sorteio eletrônico dos ingressos. 

Eram pouco mais de 17h30 quando Dalya, tendo retornado com a colega de "mendicância de ingressos" Sara ao primeiro posto da fila dos sem-bilhete, recebeu de integrantes da organização, após ser expulsa dos espaços diversas vezes ao longo do dia, a melhor das notícias: a produção iria convidar quem estava na fila - ou muitos dos que estavam, pois se fala que 47 pessoas teriam ficado de fora - a entrar e ver o show gratuitamente. Faltavam pouco minutos para a apresentação começar, como McCartney descreve na canção "Rockshow", do disco "Venus and Mars", e, como já se sabia, era preciso desligar o celular, para que este fosse recolhido e lacrado em um saco branco, para que não fossem feitos vídeos nem fotos do show.

Nervosa diante da perspectiva de que o dia passado em pé nas filas e nos pedidos não fosse em vão, a cearense não conseguia desligar o aparelho. Outras pessoas atrás na fila pressionavam para tomar seu lugar, apontando que conseguiam dar "off" em seus celulares. Dalya então contou com a ajuda de outras fãs aflitas, para conseguir enfim desativar o aparelho. Os membros do staff, como Stuart e Tyson, foram também extremamente amáveis e cuidadosos, conta a cearense, sobre o local do show em que outros velhos conhecidos das turnês de McCartney pelo mundo, como Brian, se aglomeravam e tomavam todos os cuidados necessários. Como quando do desembarque de Sir Paul no Clube do Choro, trajando camisa social de risca clara, sob um casaco fino e sobre uma camiseta vinho com a palavra "Liverpool" na altura do peito.

"Fiquei muito nervosa ao ver que ia mesmo entrar, realizar um sonho que jamais imaginaria que se tornasse realidade! Já tinha visto o Paul passar de carro ou chegar a hotéis ou passagens de som, mas jamais imaginaria ter a chance de ver tão de perto, em um show completo, de mais de uma hora e quarenta minutos. Ele olhava no olho de cada um. As pessoas diziam que o amam, e ele respondia que ama cada uma", relata a cearense. "Não conseguia desligar o celular, de tão nervosa, e também errei o caminho que os membros do staff apontavam, mesmo após eles perguntarem se falávamos inglês e pedirem que os seguíssemos até o salão interno do Clube do Choro, onde aconteceria o show", relata.

"Havia muito espaço para mais gente, e até um bar em que todo mundo podia comprar bebida. Claro que, mesmo com o calor enorme, ninguém queria sair do seu lugar para comprar nada, e sim aproveitar cada segundo do show", ilustra a cearense, rendendo homenagem também a pessoas simples, como à senhora que estava na fila dos sem-ingresso, com uma caixinha cheia de presentes artesanais para Paul, feitos por ela e pela filha, durante a pandemia. "Pessoas da produção vieram lá de dentro e buscaram  mão e filha para que entrassem logo. Tomara que tenham conseguido entregar diretamente ao Paul".

A emoção de assistir ao show a dois metros de Paul McCartney e a cada canção do repertório ao lado do cantor e compositor Samuel Rosa, ex-integrante do grupo Skank e também beatlemaníaco comprovado por discos como "Cosmotron" também fez parte do sonho de fã de Dalya Moura, que se impressionou com a performance da banda completa, incluindo o trio de metais do Hot City Horns, diferencial das turnês mais recentes de McCartney. 

"Ele estava com muita, muita vontade de tocar. E cantou muitos dos grandes clássicos,  seja dos Beatles, dos Wings ou carreira-solo. Tudo com muita energia e com muito amor, para cada um que tava ali. A banda também é incrível, e ver todo mundo de tão perto, as guitarra do Brian Ray e do Rusty Anderson, os teclados incríveis do Wix Wickens, a bateria sensancional do Abe Laboriel Jr., além de ver o Paul passando de instrumento em instrumento, do baixo Hofner à guitarra, do piano ao teclado, de 'From me to you' a 'Maybe I´m Amazed', de 'A hard day´s night' a '1985' e encerrando com a tradição de "The end, tudo é inesquecível". "Um presente pra vida inteira e uma lembrança muito forte dos familiares que não puderam, mas mereciam estar presentes".   


Dalya Moura (segunda da esquerda para a direita) e família no show de Paul McCartney no Castelão, maio de 2023



Repertório do show surpresa de McCartney no Clube do Choro, em Brasília, nesta terça, 28/11, colado no chão do palco



 


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