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Saudades do Brasil: irmãos de som, Chico Pinheiro e Romero Lubambo emocionaram o público no Sesc 14 Bis, em São Paulo

Romero Lubambo e Chico Pinheiro, no palco do Sesc 14 Bis, capital paulista, nesta terça



Saudades do Brasil. Autores do disco "Two Brothers", indicado ao Prêmio da Música Brasileira, e radicados de há muito nos Estados Unidos, Chico Pinheiro e Romero Lubambo se encontraram, enfim, com uma plateia em nosso País, nesta noite de terça-feira, 4/6, no Teatro do Sesc 14 Bis, proximidades da Avenida Paulista, com cearenses na plateia, em meio ao corre da capital após um dia de frio. Rara, raríssima oportunidade, de ver e ouvir o paulistano Chico Pinheiro no Brasil. E mais difícil ainda a chance de escutar o carioca Romero Lubambo, 68 anos, 40 anos de carreira nos Estados Unidos. A música de um Brasil que, em grande parte e infelizmente, ainda não conhece o Brasil.

Não por acaso, Romero deu seu boa noite à plateia celebrando a alegria de poder lançar o disco "Two Brothers" no País, com seu violão de nylon ao lado da guitarra Benedetto de Chico, que surgiu na efervescente cena paulistana de fins dos anos 90, início dos anos 2000, e há mais de 10 anos constrói carreira na "América" (do Norte), a partir de Nova York, viajando boa parte dos EUA, da Europa, sendo exaltado e requisitado por lendas como Bob Mintzer, Brad Mehldau, Dianne Reeves, Luciana Souza, Esperanza Spalding, entre inúmeras outras. Sem falar no disco que gravou em parceria com o guitarrista norte-americano Anthony Wilson e em seus outros discos autorais, que incluem convidados como Chico César, Gilson Peranzzetta, Lenine, Luciana Alves, Ed Motta, João Bosco, Paulo César Pinheiro, Aldir Blanc, Guile Wisnik, entre outros. Chico mudou tudo, para quem teve a chance de conhecer sua música, com os discos "Meia-noite e meio-dia" e "Chico Pinheiro", no início da década de 2000.

Romero, por sua vez, tocou com expoentes como Astrud Gilberto, Herbie Mann, Flora Purim e Airto Moreira, Paquito D´Rivera, Leny Andrade, César Camargo Mariano, Al Jarreau, Sérgio e Odair Assad, Ivan Lins, também entre inúmeros outros. Também marcou época com o Trio da Paz, ao lado de Nilson Matta e Duduka da Fonseca. O porquê de esse duo decidir estar baseado não no Brasil, mas nos EUA, seria tema para um grande seminário, extremamente necessário para debater pontos como a falta de maior visibilidade, maior conhecimento - e reconhecimento - e os desafios para a consolidação de uma carreira nesse segmento da cena musical brasileira, no próprio País.

Fiquemos, portanto, por ora, com a alegria de poder receber, no Brasil, estes dois ilustres filhos aplaudidos pelo público e por tantos artistas além-fronteiras. Uma oportunidade valiosa e reconhecida pelo público que, em plena terça-feira, compareceu ao Sesc 14 Bis para conferir o primeiro show de lançamento do disco "Two Brothers", um projeto ansiosamente aguardado por Chico e Romero, como o guitarrista paulista fez questão de destacar. A dupla se apresenta nesta quarta-feira no Sesc Santos e nesta quinta no Espírito Santo, infelizmente sem datas no Nordeste ou em outras praças. Ao menos, por enquanto. Fica a dica para os produtores e produtoras de festivais, projetos, casas de show, escolas de música, centros culturais... 


Moacir Santos, violão e guitarra

Romero Lubambo e Chico Pinheiro subiram ao palco nesta terça contando na plateia com músicos como o baterista Edu Ribeiro, o violonista Marco Pereira, o contrabaixista Serginho Carvalho, todos de São Paulo, Jomar Fábio, guitarrista pernambucano, e o cantor e compositor Italo Queiroz, de Barbalha, no Cariri cearense, que havia dois dias se apresentara no palco da Igreja do Rosário, na tradicionalíssima Festa do Pau da Bandeira de Santo Antônio, um dos grandes encontros da cultura tradicional popular no País.

E começaram o show com um senhor cartão de visitas, mostrando logo de saída as características do dueto com "April child", o clássico de Moacir Santos, ganhando novos contornos no violão de Romero ao lado da guitarra de Chico, ambos se revezando entre a base harmônica e os improvisos e chamando atenção para o estilo, os caminhos e as ênfases de cada um. Tudo extremamente limpo, harmônico, musical, com o entrosamento de antigos parceiros dando fluidez mesmo aos momentos mais desafiadores, de execução de trechos mais intricados dos arranjos para "duas vozes", como aconteceria várias vezes ao longo da noite, prendendo a respiração do público, para muitos aplausos.

"Ele escreve difícil. Olha aqui o arranjo", brincou Romero, extremamente bem-humorado ao longo de todo o show, ao mostrar as três páginas de um dos temas escolhidos para a noite na capital paulista. 

E se o suingue e a alegria de "April child" acolheram o público mostrando a que vinha a dupla, o lirismo e o surrealismo de "Morro Dois Irmãos", clássico de Chico Buarque, levaram a plateia por outras direções. "O disco se chama 'Two Brothers' por causa dessa música", destacou Romero, antes de emocionar o público com uma das mais belas composições de um dos maiores autores do Brasil. E antes de brindar o público mais focado no jazz com "Beauty and the beast", a primeira faixa do disco "Native Dancer", de Milton Nascimento e Wayne Shorter, de 1975. "Uma música que a gente adora", ressaltou Chico Pinheiro, depois de um espetáculo de improvisação.




Filó, Djavan, Aldir e mais Chico

E que maravilha ouvir as cores brasileríssimas de "Jogral", de Filó Machado, Djavan e José Neto, com o violão de Romero e a guitarra de Chico, "pra cumprir melhor o desafio". E de "Aquele um", de Djavan e Aldir, também parceiro de Chico, sempre com farto espaço para a improvisação e com o incentivo mútuo entre os músicos, entre sorrisos, a que o outro vá mais longe, arrisque mais, encontre novas paisagens nas improvisações. 

E assim foi também no lirismo do clássico "Samba e amor", pleno de notas azuis no diálogo entre os amigos no palco, que também destacaram a importância de João Donato antes de mandarem uma recriação "valendo" para "A rã" e de celebrarem o Jobim menos recorrente de "The red blouse".  

Era preciso encerrar o show, "porque o Sesc tem horário pra fechar", contaram, do palco, antes de um dos melhores momentos da noite, com o super baião "Pro Flávio", de Romero Lubambo, homenagem a seu pai, com a intensidade da música do Nordeste, bordão corda solta ao longo de toda a música e um tempero especial de ambos. Arrebatador!

Com muitos pedidos de bis, "Wave" chegou em uma versão mais curta que a média das músicas da noite, mas nem por isso menos cativante. Com jogo ganho desde o início, e ressaltando a alegria de tocar no Brasil, para, além dos fãs, amigos e familiares, Romero Lubambo e Chico Pinheiro deixaram um gosto de "quero mais" para quem esperava talvez por surpresas do repertório de cada um. Mas fizeram questão de explicar que, para este disco tão esperado por ambos, optaram por homenagear músicos que os influenciaram, privilegiando o repertório de outros autores, em vez de suas composições próprias, que marcam seus discos individuais. 

Chico e Romero mostraram por que precisamos deles mais perto, mais vezes por aqui. Em benefício do público. Porque o Brasil ainda precisa conhecer o Brasil.  





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